Por trabalharmos frequentemente com gestão de crises, principalmente na internet, nós da Presença Online já abordamos o tema em alguns textos sobre o assunto, como Os segredos de uma boa gestão de crise na internet e nos últimos dias um caso que nos chamou a atenção foi o rato supostamente encontrado dentro de uma garrafa da Coca-Cola.
No início de setembro de 2013 foi veiculada uma matéria em um telejornal vinculando um problema recente de um consumidor com a Coca-Cola à outra matéria veiculada há cerca de dez anos. Nela um consumidor alegava ter tido sérios problemas de saúde após o consumo do refrigerante e também questionava a empresa por ter encontrado um rato dentro de uma das garrafas compradas.
O vídeo caiu na internet e teve lá seus milhões de acessos e compartilhamentos negativos para a marca. Mas será que uma empresa tão grande como a Coca também pode ser abalada por uma crise no ambiente digital?
Coca-cola e a crise do rato
Para concluirmos se o caso do rato na Coca-Cola pode ser considerada uma crise, fizemos um monitoramento da marca e observamos que em média ela é citada cerca de 5 mil vezes diariamente nas principais redes sociais (Twitter e Facebook), isso levando em consideração que há perfis e grupos fechados/bloqueados que não são coletados nas ferramentas de monitoramento.
Para efeito de comparação, trabalhamos com duas amostras com 300 menções cada. A primeira captura aconteceu no dia 17/09 quando o assunto estava em seu ápice de compartilhamentos e depois coletamos mais 300 menções no dia 30/09, data em que a empresa já havia se posicionado sobre o caso e que apesar do tema já ter esfriado, ainda era presente.
O monitoramento foi feito com o termo “coca cola” e configurado para coletar menções no Twitter e Facebook e apenas de perfis em língua portuguesa. O que descobrimos:
Qual a dimensão do problema?
Uma das maiores dificuldades de uma crise é identificar a dimensão do problema, já que marcas grandes e tão importantes como a Coca-Cola devem sofrer pequenos ataques constantemente.
Para medir o impacto deste assunto dentro do universo da marca fizemos um levantamento de dados que comprovou que a maior parte das menções no dia 17 (82%) se referiam ao caso do rato, o que demonstrou um forte potencial de abrangência.
Contudo, 13 dias depois essa porcentagem caiu para 35%, o que já evidencia um “esfriamento” da crise. Veja o gráfico:
Isso nos mostra a proporção que o assunto tomou em relação à atividade habitual da empresa na web. A tendência é que cada vez mais o assunto desapareça das menções.
Qual o impacto das ações tomadas?
A primeira reação da marca demorou alguns dias para acontecer, no dia 17/09 foi publicado um comunicado oficial sobre o fato em sua página no Facebook, com o objetivo de dispersar os boatos.
Aparentemente só o comunicado em texto não supriu as expectativas dos fãs e não acalmaram as publicações sobre o problema. No dia 26/09, numa nova tentativa de amenizar a crise, a empresa publicou em seu canal oficial do YouTube um vídeo sobre como funciona o processo de produção do refrigerante e convidando as pessoas a conhecerem uma fábrica da Coca-Cola.
Para vermos se o posicionamento da empresa alterou o teor das menções, nos gráficos abaixo comparamos as duas datas de análises e a classificação das menções coletadas:
1ª amostra (17/09)
2ª amostra (30/09)
Percebemos aí uma neutralização do teor das mensagens dos usuários nas redes sociais. No entanto, dentro do percentual negativo, a proporção do que se falava sobre o caso do rato continuou na faixa dos 96%.
O fato do número de menções tidas como “neutras” terem aumentado proporcionalmente ao total significa que as ações tomadas deram certo? Em uma análise rápida a resposta seria “sim”. Contudo, observamos dois pontos curiosos:
- 60% destas menções neutras se referem a um único artigo sobre a posição da Coca no ranking de maiores empresas do mundo;
- Em meio à amostra (600 itens), só foram encontradas 5 citações ao vídeo e/ou texto oficial da empresa, ou seja, estas ações não serviram para estimular embaixadores da marca à defendê-la.
Levando-os em consideração vemos que as ações tomadas pela empresa para amenizar o problema não tiveram tanta eficácia assim.
Qual é o resultado prático para a Coca-Cola?
O comportamento do brasileiro nas redes sociais é muito irônico e não foi diferente com o problema da Coca. A partir das citações coletadas observamos que ao longo do tempo elas foram se tornando cada vez mais sarcásticas e contendo um tom humorado, apesar de continuar sendo menções negativas.
Provavelmente o problema não tomará proporções que ofereçam riscos à marca em um médio e longo prazo.
Caminhos alternativos
Baseados em trabalhos que já realizamos pela Presença Online em gestão de crise, elencamos algumas ações que poderiam ter sido tomadas pela empresa para dissipar o problema e tentar reverter a imagem negativa perante os fãs e consumidores.
- Mobilização de influenciadores
Utilização de influenciadores da web para difundir a posição oficial da empresa e usá-los como embaixadores da marca poderia ter sido uma das medidas tomadas.*
- Hotsite de visita à fábrica
Apesar do vídeo que convida as pessoas a conhecerem o processo produtivo do refrigerante, a empresa poderia ter dedicado um hotsite temático para fortalecer este convite e fazer com que as pessoas realmente se sentissem parte. Vídeos interativos que simulassem uma visita também seriam bem vistos, intercalando as instalações com entrevistas de responsáveis técnicos pela produção.
- Combate a boatos
A Coca-Cola possui em seu site uma página com o objetivo de esclarecer boatos sobre seu produto. É uma página bem construída e que tem respostas muito bem embasadas em códigos de regulamentação e estudos científicos e poderia ter usado seu potencial de indexação nos buscadores para colocar sua posição quanto ao suposto boato do rato.
- Relacionamento com a mídia
A empresa é conhecida por ter um bom relacionamento com a mídia, entretanto, aparentemente não usou desta alternativa para tentar mostrar seu lado oficialmente em grandes canais de massa. Uma boa assessoria de imprensa nestes momentos ajuda bastante a empresa que passa por um revés como este.
Conclusão
Baseada na análise de todos os itens apresentados, concluo que: apesar de ter havido uma grande propagação do problema e os caminhos tomados não serem eficientes no combate aos boatos, levando em consideração as características do perfil dos consumidores do refrigerante, o “efeito onda” da crise está em seu momento de declínio. A menos que um fato novo surja, a Coca-cola não sofrerá nenhum revés significativo em suas vendas.
Contudo, cada crise é também uma oportunidade para realçar pontos importantes no que uma marca tem para dizer. É neste momento que a mídia e os olhos dos consumidores estão atentos aos movimentos da empresa. A Coca-cola poderia ter saído da situação adversa maior do que entrou, mas não o fez.
Ps. Não tenho o costume de escrever artigos extensos como esse, portanto, se cometi alguma falha, peço que relevem. Ah, agradeço os feedbacks nos comentários! Até!
*Update
Uma visita à fábrica verde da Coca-Cola, que fica em Maceió, foi organizada no sábado, dia 28, com a presença de 40 influenciadores online, dentre eles Alexandre Inagaki (Pensar Enlouquece), Nick Ellis, Caio Novaes (Brogui), Humberto Oliveira (O Buteco da Net), Ana de Cesaro (Tá e Daí?) e Samantha Shiraishi (A Vida Quer), que estão compartilhando suas experiências em blogs e/ou redes sociais.
Além do vídeo oficial, um outro vídeo com Iberê Thenório, do canal Manual do Mundo, visitando os bastidores de uma fábrica da Coca-Cola, entrou hoje no ar.